[Artigo de João Capiberibe]
No exato momento em que li a pergunta do facebook, pensava na sessão histórica do Senado em que foi aprovada, na quarta-feira, 13/11, em 1º turno, a PEC do Voto Aberto, que dá fim a todas as hipóteses de deliberações secretas no âmbito do Poder Legislativo.
Esse projeto, que levou cinco anos entre a apresentação e a votação na CCJ, estava há sete anos adormecido nos escaninhos da Câmara dos Deputados e só foi despertado graças à pisada de bola da não cassação, pelo plenário daquela Casa, do deputado federal Natan Donadon, que se encontra preso cumprindo uma condenação de 13 anos de cadeia por desviar 8 milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia.
Um vexame, mas para purgar seus pecados a Câmara colocou em votação e aprovou por unanimidade, em setembro passado, a PEC do Voto Aberto.
As seis horas de sessão, em que dezenas de senadores divergiram duramente naquela noite de quarta-feira, fluíam em minha mente como um filme. A discussão começou com o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) defendendo o voto secreto com unhas e dentes lembrando “que Demóstenes e José Dirceu foram cassados por voto secreto”.
Em oposição a Barbalho, o senador Mário Couto (PSDB-PA) disse: – Quem quer esconder o voto não é sério e não honra o voto que recebeu.
Paulo Paim, defendendo o voto aberto, observou que em São Paulo, Roraima, Minas Gerais e no seu Rio Grande do Sul, o voto secreto já foi abolido nas assembleias legislativas.
No decorrer do debate surgiram várias propostas. Havia senadores que queriam o voto secreto para votações de vetos presidenciais, autoridades dos tribunais superiores, embaixadores e diretores de agencias reguladoras, outros queriam o voto aberto apenas para cassações e outros não queriam mudar nada, defendiam a manutenção dos procedimentos atuais.
A única bancada em que o voto aberto era unanimidade era a do PSB, meu partido. Nas demais as divergências eram gritantes, sobretudo no PMDB, que tem a maior bancada.
O senador José Sarney (PMDB-AP), eleito quatro vezes presidente do Senado em votações secretas, foi ouvido em sepulcral silêncio pelo plenário. Ele bradou contra o voto aberto sacando como argumento que “a Constituição diz que é impossível apresentar emenda constitucional contra o voto secreto”. Pelo resultado da votação, que decidiu pelo voto aberto, dessa vez, o veemente discurso e os argumentos de José Sarney não foram levados a sério.
Quem liderava a oposição ao voto aberto eram ex-presidentes e o atual presidente da Casa. Primeiro Jader, depois Sarney, e, por fim, Renan, seguidos pelos seus áulicos na composição do poder da Casa constituído na mesa do senado.
Os donos do poder no Senado enfrentavam os sem cargos.
O senador Romero Jucá, sempre aliado ao poder, chegou a tentar burlar o regimento interno apresentando um requerimento preliminar que poderia “desmembrar” a proposta. Na prática esse requerimento serviria para desmantelar o voto aberto relegando-o apenas às votações de cassação de mandato.
O requerimento não prosperou, porque o líder do PSB, Rodrigo Rollemberg, mostrou que não é possível fazer desmembramento de proposta que tem origem na Câmara dos Deputados. Isso obrigou Jucá a voltar atrás e retirar o requerimento.
O que está por trás de tanta argumentação em torno do voto secreto é a eleição das mesas diretoras.
Encerrado o debate, o voto aberto venceu o primeiro turno das votações, com 54 votos a favor contra 10 contrários e uma abstenção. Alguns senadores que haviam se pronunciado contra o voto aberto, terminaram votando a favor. E, dado que o debate pôde ser acompanhado ao vivo pela TV Senado e que a votação era em aberto, pode-se ter uma medida do peso determinante deste fator na s votações.
O texto, que não teve alterações, seguiu para o segundo turno de votação na mesma sessão plenária. Mas depois de mais de seis horas de debates acirrados, a votação final da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 43/2013 ficou para a próxima semana.
Se a pergunta do facebook fosse: O que lhe preocupa neste momento?
Preocupa-me o que irá acontecer.
Nesse interim, os defensores do voto secreto podem convencer ou até mesmo cooptar alguns senadores que sinceramente acham que devem ser preservadas as votações secretas para vetos e autoridades. Caso isso aconteça, voltamos a estaca zero.
Senti a falta na sessão da presença popular. Precisamos encher as galerias do Senado para que a vontade dos 688.807 brasileiros que já assinaram a petição online pela aprovação do voto aberto se torne realidade.
Conclamo os eleitores a conversar e pressionar, pelas redes sociais ou diretamente por e-mails, com senadores e senadoras que nesse feriadão visitam suas bases, e que estão inseguros em relação ao voto aberto no parlamento. Também os conclamo a assinar o abaixo-assinado pela aprovação do voto aberto neste endereço:
https://secure.avaaz.org/po/brazil_open_vote_sept/
Sou um entusiasta do fim do voto secreto em todos os níveis e em todas as votações do Legislativo por entender que com o voto aberto será possível mudar o relacionamento dos parlamentos com a sociedade e caminhar um pouco mais em direção à consolidação da democracia. O voto aberto tem potencial para reduzir a distância enorme que existe hoje entre os representantes e os representados, pois torna o ato de decidir uma responsabilidade vinculada diretamente com a base eleitoral do parlamentar e com a opinião pública de um modo mais geral.
Além disso, é um instrumento que pode vir a transformar profundamente as relações internas de poder no Senado, que há tempo se sustentam em um jogo de articulações políticas as quais passam ao largo dos interesses da população. Sabedores disso, os donos do poder no Senado defenderam sua posição e usaram suas estratégias nesta quarta-feira, mas perderam. No entanto, recobrarão a carga na próxima votação para impedir que o voto aberto seja enfim ratificado.