É o que apontam depoimentos de ex-exilados brasileiros ouvidos nesta segunda (14) no Senado. Um deles definiu o consulado do Brasil no Chile como “covil de torturadores”. Subcomissão, presidida por João Capiberibe (PSB-AP), pedirá ao Ministério da Defesa e ao Itamaraty lista de oficiais e diplomatas que serviram à época naquele país.
Veja a reportagem da TV Senado: http://bit.ly/1m7s80W
[Leia na íntegra a matéria da Agência Senado]
Brasileiros vítimas de tortura no Chile reclamaram da omissão das autoridades diplomáticas nacionais e alertaram para o fato de agentes do Brasil terem ensinado técnicas de tortura e interrogatório aos chilenos. Os ex-presos políticos foram detidos no Estádio Nacional, em Santiago, transformado em campo de concentração de prisioneiros políticos após o golpe que derrubou o presidente Salvador Allende, em 1973. Eles participaram, na manhã desta segunda-feira (14) de uma audiência da Subcomissão da Memória, Verdade e Justiça do Senado para esclarecer ações ilegais de integrantes da polícia política brasileira.
Segundo os convidados, após o golpe no Chile, uma das primeiras providências dos militares foi perseguir estrangeiros, que passaram a ser considerados inimigos do regime, inclusive aqueles que não estavam ligados a nenhuma atividade política.
– Temos informações de que o Ministério das Relações Exteriores e a embaixada brasileira sabiam da situação, só que eles estavam atrelados à ditadura e não à proteção de seus cidadãos. Eles estavam lá para ensinar os chilenos a torturar. Entre os brasileiros presos, havia pessoas que não tinham nada a ver com atividade política e não receberam atenção nenhuma do governo brasileiro – afirmou o ex-preso e advogado Vitório Sorotiuk, que entregou à Subcomissão um documento do Ministério das Relações Exteriores com uma lista de nomes de torturados no Estádio Nacional.
– Se alguém ainda tem dúvidas a esse respeito, basta assistir ao documentário da diretora chilena Carmen Luz Parot, intitulado Estádio Nacional, de 2002, em que ela revela que os verdugos chilenos receberam a assessoria de militares brasileiros. E essa assessoria não foi apenas para ensinar como é que se torturava. Eles também levaram equipamentos elétricos de tortura que não existiam no Chile – relatou Vitório.
O presidente da Subcomissão, senador João Capiberibe (PSB-AP), disse que vai apresentar requerimento ao Ministério da Defesa solicitando os nomes de todos os oficiais das três armas que estiveram no Chile naquele período e também para o Ministério das Relações Exteriores, com os nomes de diplomatas e cônsules que atuaram na época. Na opinião dele, as Forças Armadas precisam reconhecer seus erros e pedir desculpa à sociedade brasileira.
A deputada Janete Capiberibe (PSB-AP) afirmou que Chile, Argentina e Uruguai, ao contrário do Brasil resgataram a verdade e não absolveram os criminosos ditadores. Ela pediu a mudança na Lei da Anistia, editada em 1979 para perdoar crimes políticos cometidos entre 1961 e 1979, período que inclui a ditadura militar.
Antro
Depois de narrar seu sofrimento, outra vítima da tortura, Ubiramar Peixoto de Oliveira, classificou o consulado brasileiro no Chile de um “antro e covil de torturadores”. Já Tomás Togni Tarqüinio disse que o mais trágico foi que as prisões no Estádio Nacional foram a primeira cooperação internacional de tortura e repressão.
– Apenas a ditadura brasileira teve esse papel de enviar policiais brasileiros para interrogar e torturar e ensinar os chilenos esse tipo de prática – afirmou.
Os perseguidos políticos pediram a investigação da atuação das embaixadas e consulados no regime militar.
Zuzu
O senador Capiberibe lembrou que em 14 de abril de 1976 (há exatos 38 anos) morreu num acidente de carro a estilista Zuzu Angel, cujo filho havia sido assassinado pela ditadura cinco anos antes.
– A versão do acidente só foi desmentida em 1998, até então ela criara muitos embaraços à ditadura – afirmou ele.
A deputada Janete Capiberibe acrescentou que os jovens que não viveram a repressão precisam saber do que ocorreu na época para que erros do passado não sejam novamente cometidos.
Resgate
Instalada em abril do ano passado, a Subcomissão Permanente da Memória, Verdade e Justiça funciona no âmbito da Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, com o objetivo de resgatar os fatos ocorridos durante o regime militar (1964-1985) e contribuir para a Comissão Nacional da Verdade, instalada pelo Executivo.
Também relataram suas experiências à Subcomissão na manhã desta segunda-feira (14) os ex-presos Dirceu Luiz Messias, Otto Brockes, Vicente Faleiros, Nielsen de Paula Pires e Osni Geraldo Gomes, que vive na Suécia e enviou um emocionado depoimento em vídeo.
Eles vão colaborar com a Comissão Nacional da Verdade na tentativa de reconhecer os torturadores brasileiros que atuaram no Chile. Já na tarde desta segunda-feira, eles serão recebidos pela Comissão da Verdade.
Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)