A cheia do Rio Madeira, em Rondônia, é a maior já registrada desde que seu nível passou a ser medido. De acordo com a defesa civil de Porto Velho, capital de Rondônia, já são mais de 1600 famílias atingidas.
No último dia 13 de fevereiro foi decretado “estado de emergência” no município de Porto Velho, onde o carnaval foi cancelado, e, de acordo com o prefeito Mauro Nassif, do PSB, provavelmente será decretado em breve o “estado de calamidade pública”.
O Serviço de Proteção da Amazônia (Sipam), também, trabalha na perspectiva de decretar estado de calamidade pública, caso o nível do Rio Madeira continue subindo. Enfermidades como diarréia, leptospirose, hepatite, febre tifóide e até mesmo cólera são possibilidades reais.
Embora esteja alto o volume de chuva nesta época, é impossível dissociar a situação da presença das usinas de Santo Antônio e Jirau. Os moradores da região dizem nunca terem presenciado uma cheia desta magnetude e que antes da existência das usinas, eram previsíveis as datas das cheias que atingiam seu máximo.
Eleito pelo Amapá e considerado um cidadão amazônida, o senador João Capiberibe (PSB) faz um apelo às autoridades brasileiras para que se pronunciem com urgência sobre a enchente recorde do Rio Madeira e de outros rios da região.
“Precisamos saber se as usinas são responsáveis ou não pela cheia do Rio Madeira e seus afluentes. O fato é que acumulação de água nos reservatórios e o aumento da vazão dos vertedouros das usinas de Santo Antônio e Jirau potencializam os alagamentos naturais do período e mais áreas, que antes não sofriam alagamento”, afirmou o senador.
“Isso é importante para que não tenhamos os mesmos problemas no Rio Xingu, onde está sendo construída a faraônica Usina Hidrelétrica de Belo Monte, uma obra que nem os militares ditadores ousaram tornar realidade nos tempos de ocupar a Amazônia a qualquer custo. Afinal, a cheia do Rio Madeira deixa transparecer que as três usinas: Santo Antônio, Jirau e Belo Monte tiveram os seus impactos ambientais subdimensionados. O que foi uma decisão criminosa”, concluiu Capiberibe na tarde desta quarta-feira (26).
SAIBA MAIS:
O consórcio construtor da usina de Jirau, Energia Sustentável do Brasil, enviou uma notificação, em seis de fevereiro passado, endereçada ao presidente da Santo Antônio Energia, Eduardo de Melo Pinto, com copia à Agência Nacional de Águas (ANA), ao IBAMA, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), afirmando que a hidrelétrica de Santo Antônio estaria desrespeitando o limite de acúmulo de água em seu reservatório estabelecido pelo seu projeto. A altura máxima suportada por Jirau é de 74,8 metros em relação ao reservatório da usina de Santo Antônio. Porém, a usina de Santo Antônio estaria operando com um reservatório que, no início de fevereiro, teria ultrapassado a cota de 75 metros, atingindo o limite que garante a segurança e estabilidade do empreendimento, alegam os dirigentes de Jirau.
Esta situação traz à tona a briga entre os dois consórcios na ANEEL, em que ambos exigem o aumento da cota de seus reservatórios e o que garante, para um ou para outro, uma receita extra estimada em R$ 3 bilhões ao longo de suas concessões. Porém, o aumento da cota da UHE de Santo Antônio diminuiria a geração de energia da usina de Jirau.
Na primeira semana de fevereiro, o Ministério Público Federal, em Rondônia, abriu inquérito civil para investigar três aspectos que envolvem a usina Santo Antônio:
– descumprimento das condicionantes da licença de operação;
– a falta de consulta popular sobre a elevação no nível do reservatório da hidrelétrica;
– e os impactos socioambientais foram estimados abaixo do real.
Além de toda essa situação, o O consultor ambiental boliviano, Walter Justiniano Martinez tem em mãos um relatório onde consta que o Brasil é o culpado pelas enchentes na Bolívia, que culminou com 60 pessoas mortas e 90 mil cabeças de gados perdidas.
O prejuízo é de cerca de 50 bilhões de dólares e mais de 40 mil hectares de culturas agrícolas afetadas.
As represas de Jirau e Santo Antônio não deixam a água escoar, culminando com enchentes rio acima, pegando o Beni. As fortes chuvas que caem sobre a Bolívia agravaram ainda mais o problema.
A Bolívia conhecia os efeitos de barragens brasileiras na Amazônia. O governo sabia que as barragens construídas na bacia do rio Madeira causariam grandes inundações no país por mais de seis anos.
Em 2006, o ministro dos Negócios estrangeiros David Choquehuanca, enviou uma carta para seu homólogo brasileiro manifestando o perigo da construção destas barragens para a Bolívia. O governo boliviano já tinha alertado sobre os impactos há mais de sete anos.
Em 2011, um seminário sobre projetos de energia no Brasil, o Vice Ministro Juan Carlos Alurralde, disse à Reuters que o governo não estava satisfeito com os relatórios do Brasil em defesa da hidrelétrica e esperava mais esclarecimentos e garantias.
Então, o primeiro secretário da Embaixada do Brasil na Bolívia, Ruy Ciarlini, disse à Reuters que eles tinham “dados científicos que mostram que não há nenhum risco”. Até agora, em Beni foram relatadas a morte 84 mil cabeças de gado e as perdas de 50 bilhões de dólares. Mais de 39 mil hectares de culturas afetadas, enquanto o número de vítimas cresce dia a dia devido às enchentes. O presidente da Bolívia, Evo Morales, solicitou investigações sobre o impacto das enchentes no Beni.
“Sou um senador eleito pelo povo do Amapá, portanto sou um senador amazônida e como tal não posso me calar diante das cheias do Rio Madeira, principalmente por que esse rio faz parte de um pedaço importante da minha história de vida”, ressaltou o senador João Capiberibe (PSB-AP).